Palavras Domesticadas

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domingo, 31 de março de 2013

A Conversão de Bob Dylan à Guitarra Elétrica

Em 1979 foi publicada uma edição especial  da revista Violão & Guitarra, sobre a country music e suas variações. O destaque de capa e do texto da revista é Bob Dylan e suas múltiplas facetas, desde seu início de carreira, como astro da folk-music, até sua adesão à guitarra elétrica, que não foi nada pacífica. Assim como aqui no Brasil, quando a ala mais tradicionalista da MPB via a guitarra como uma alienação e símbolo de colonialismo (vide a passeata contra a guitarra, em 67), também nos Estados Unidos os defensores das tradições de música folk despejaram sua ira sobre Bob Dylan, quando o mesmo subiu ao palco do tradicional festival folk de Newport empunhando uma guitarra. A eles parecia uma traição, um rendimento do novo artista mais festejado da vertente musical ao comercialismo do rock. Essa transição foi traumática, porém necessária.
A afirmação ao lado, retirada da revista, fala de um encontro de Dylan com os Beatles, em 65, o ano em que ele assume seu lado rocker. Não sei até que ponto a afirmativa pode ser levada ao pé da letra, mas com certeza aquele encontro pode ter influenciado em sua mudança. Acredito que Muddy Waters, responsável pela eletrificação do blues (outra fonte de inspiração do jovem Dylan), possa ter tido uma influência direta em sua opção pela eletrificação de seu som. Mas que a aproximação com os Beatles pode ter dado o impulso necessário, isso é verdade. Nesse trecho a revista diz:
"Em uma turnê em 65 pela Inglaterra, Dylan encontra-se com os Beatles - que tinham prestado um tributo à sua música com 'You've Got To Hide Your Love Away', no disco 'Help'. Seria uma abertura, começa a experimentar instrumentos elétricos, e no Festival de Newport, no mesmo ano, surge, para total desagrado de seu público, um Dylan eletrificado, de roupas de veludo, cabelo arrepiado e óculos escuros, diferente do anterior, cantor pobre, poeta revolucionário."
O episódio do Festival de Newport de 65, tão marcante em sua biografia, é assim descrito na revista:
"Newport, Rod Island, 25 de julho de 1965. Está acontecendo o Festival Folk. Milhares de jovens esperam um cantor, clamam seu nome, ainda que sabendo que tivesse acabado de lançar um disco. Talvez vários jovens, entre estes, tivessem esperança de que a tão esperada estrela da música folk tivesse mudado de opinião e decidisse voltar à época de seus primeiros êxitos, à época de 'Blowin' In The Wind'. Ou será que todos aqueles jovens gritam para desafogar seus desenganos?
Dylan e Joan Baez, parceira no folk
Porque, quando Bob  Dylan sobe sao palco, com a guitarra elétrica no pescoço, um suspiro de frustração percorre a multidão. Barbara e Sy Ribakove, biógrafos de Dylan, descreveram assim a cena: 'Quando o público fixou seu olhar no instrumento, despertou-se a ira. A guitarra elétrica era o odiado símbolo do rock'n roll. E precisamente nas mãos do homem que para eles tinha sido um Deus, convertendo-se no símbolo da traição'.
O público escutou duas canções em completo silêncio. Mas ao iniciar a terceira, alguns exigem que Dylan troque a guitarra pelo violão ou ainda que vá se apresentar no show popular de Ed Sullivan. Dylan obedece no mesmo instante, deixa de tocar e abandona, tristemente, o palco. Pouco depois, o cantor Peter Yarrow, o leva mais uma vez ao cenário, Dylan adianta-se ao microfone e com os olhos umedecidos, mais seu velho violão, canta sua despedida: 'It's All Over Now, Baby Blue'.
A despedida triste de Dylan assinala uma importante transfiguração na história da folk-music. Porque não se trata somente da troca dos instrumentos musicais, e basicamente tampouco se é folk-rock ou não.  O que Bob Dylan fez,  foi por a folk-music frente a uma nova perspectiva, uma nova função. A partir daquele momento, a folk-music significa tradição e no lugar do antigo conceito surgiu um novo: música."

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