Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 5 de abril de 2013

Raul Seixas - Revista Rock, a História e a Glória - 1975 (2ª Parte)

"Quando Raul sumiu de novo um tempo enorme e voltou com um álbum justamente chamado Novo Aeon, fiquei temendo pelo superdoutrinamento da coisa. Vou conversar com Raul, ele me canta as músicas. Não são catequéticas; são claras, sarcásticas, bonitas e bem humoradas. 'O Novo Aeon está no ar. A gente pode sentir... sentir o cheiro, sabe como é?  Não se pode fazer ou deixar de fazer nada, a gente só pode ser. No princípio era o verbo, não é? Ser. Estar bem consigo mesmo. Quem está bem consigo mesmo está pronto para o Novo Aeon, que vai substituir essas estruturas velhas, gastas, em que vivemos há muito tempo. Pensamento racional, cartesiano, europeu. As pessoas parecem que ficam o tempo todo querendo consertar uma velha colcha com remendos novos. Não dá, é preciso jogar a colcha fora. Mas eu não vou convencer ninguém disso. Eu vou ficar legal comigo mesmo e deixar que os outos fiquem legais consigo mesmos. É disso que eu falo em Eu Sou Egoísta. É isso que é o Novo Aeon.'
Raul me dá outros toques: 'Este álbum é todo em cima do Livro da Lei, que Aleister Crowley recebeu, ditado por um Ser do Novo Aeon. Mas não é... apostólico. São simplesmente coisas que eu descobri e digo, porque meu trabalho é dizer, sacar, dizer. Não sou soldado. Sou o cientista que faz a granada que o soldado lança pra explodir tudo. Eu saí da A.A., sabe? Praticamente fui expulso. Transei uma outra depois, num nível mais alto, ela não tem sede, não se reúne propriamente... Mas agora estou na minha. Eu sempre fiz isso, tirei de tudo um pouco para mim'.
Raul canta uma música que fala dos tempos em que sua mãe lhe dizia que 'Deus vê tudo, está em todo lugar'. 'Desde muito cedo eu comecei a desconfiar desse tipo de religião.. Desde cedo. Mas também não levei Alesister Crowley totalmente a sério, não. Aliás, eu acho que é isso que ele queria. Tirei coisas dele para mim, aproveitei'. Raul me mostra suas anotações sobre o Livro da Lei. 'Cada homem e cada mulher é uma estrela'. 'O sucesso é tua prova'. 'O amor é o princípio, amor sob controle. 'Esta é toda Lei: faze o que tu queres'. São ideias de Crowley e não são ideias de Crowley. São leis esotéricas e letras de Raulzito Seixas.
A Maçã é sobre outro grilo antigo de Raul: a relação homem/mulher. 'Quando eu descobri a força oculta da mulher, do princípio feminino que é chamado de Nuit no Livro, eu fiquei apavorado. A mulher é como uma aranha, poderosa porque dá à luz o homem, espera ele crescer e depois o devora, devora sua força, o amor que ele tem por si mesmo. E depois o faz renascer, e então reproduz a si mesma em outra mulher.
  Conversei sobre isso com a Yoko Ono e ela me deu o toque: Let the boat go, deixa ir, não tenha medo. 
 Mas eu fiquei desnorteado muito tempo. A Maçã já é uma tentativa minha de transar o problema, transar essa relação com o princípio feminino.'
Raulzito Seixas, Pantera e self-made mago, bruxo autônomo, me mostra também seus últimos escritos sobre o assunto. Uma frase é típica: 'Afastai-vos, batráquios! Não esperem de mim um corrimão, um abrigo, para tuas almas inquetas. Profetizar? Quem há de?'"

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