Palavras Domesticadas

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quarta-feira, 3 de julho de 2013

O Centenário de Wilson Batista

Na data de hoje, um dos maiores sambistas do Brasil de todos os tempos faria cem anos: Wilson Batista. Reconhecido como um verdadeiro mestre na arte de criar sambas que se tornaram antológicos, Wilson Batista, apesar de tudo isso não está sendo lembrado nessa data tão marcante, como outros foram reverenciados. Na verdade, Wilson, apesar de seu talento e do sucesso que vários de seus sambas alcançaram, nunca conheceu a fama em vida. Talvez o momento que seu nome ficou mais em evidência foi quando travou uma polêmica musical com ninguém menos que Noel Rosa, o que rendeu sambas antológicos de ambas as partes. A cantora Cristina Buarque uma vez declarou: "Wilson Batista é um dos maiores compositores de samba de todos os tempos. Paulinho da Viola e João Gilberto também dizem isso. É uma injustiça que um sambista tão atual ainda hoje, seja pouco conhecido".
Tenho orgulho de ser conterrâneo desse mestre do samba, nascido em Campos dos Goytacazes/RJ em 03 de julho de 1913, e gostaria de hoje estar comemorando a data em alguma festividade, show ou exposição em homenagem a Wilson, mas os órgãos culturais (?) do poder público municipal ignoraram a data, apesar do pedido de apoio, através de projetos apresentados por admiradores de um de nossos mais ilustres conterrâneos. Mas esse esquecimento, infelizmente, é geral, pois pouco ou nada se falou sobre a data nos grandes órgãos de imprensa do país. 
Estandarte do bloco Rapaz Folgado
Alguns abnegados admiradores, por conta própria resolveram homenagear o grande mestre, criando o bloco Rapaz Folgado (título de um dos sambas feitos por Noel na famosa polêmica musical), que saiu pelas ruas ruas da cidade há alguns meses, homenageando Wilson Batista através de seus sambas e marchinhas, uma iniciativa das mais válidas e bem vindas, para provar que em sua cidade de natal Wilson não foi esquecido, e sua arte será sempre lembrada. Mas Wilson merecia mais.
Como compositor, Wilson Batista sempre se destacou pela perfeição das melodias e pelas letras oportunas de seus sambas e marchas de carnaval. Suas músicas falavam dos assuntos atuais, sempre com uma dose de humor e sarcasmo, sendo um cronista musical de seu tempo. Wilson em muitos de seus sambas fazia apologia à figura do malandro, personagem marcante na vida carioca, e no Rio, para onde se mudou ainda adolescente, fez sua fama no meio do samba. A fama de "malandro" que criou acabou causando para ele uma certa discriminação por parte de alguns compositores de renome, por considerá-lo "marginal" e frequentador de ambientes não muito recomendados, porém era lá que Wilson buscava inspiração para muitos de seus sambas.
Conta-se que Wilson Batista, ao contrário de muito de seus colegas de samba e malandragem, não era muito chegado à bebida, mas, como se dizia na época, preferia um "fumacê". Tanto é que talvez a primeira música feita no Brasil a citar a maconha é de autoria de Wilson - o samba Chico Brito, que diz: "Chico Brito fez do baralho seu melhor esporte/É valente no morro/Dizem que fuma uma erva do norte". Paulinho da Viola, um fã confesso de Wilson Batista gravou magistralmente esse samba, além de outros de sua lavra, como "Nega Luzia" e "Meu Mundo É Hoje", um dos mais belos sambas de Wilson, que traz uma letra reflexiva, onde ele diz: "Eu sou assim, assim morrerei um dia/ Não levarei arrependimento/ Nem o peso da hipocrisia".
Wilson Batista também pode ser lembrado por outros tantos sambas antológicos, que fizeram sua fama, e o colocaram em um lugar merecido, na galeria de nossos melhores sambistas. Posso citar "Acertei no Milhar", "Lenço no Pescoço", "Samba Rubro-Negro", "Bonde São Januário", "Louco", "Mundo de Zinco", dentre tantos outros.
Apesar de tantos sambas de qualidade, Wilson Batista nunca receberia o que fez por merecer pelo conjunto de sua obra. Moreira da Silva, um de seus intérpretes uma vez disse: "Se fosse um país onde os direitos do compositor estivessem protegidos, e se lhe fosse feita justiça na época, Wilson Batista teria ficado milionário.Até hoje quando canto em festas, me pedem para cantar "Acertei no Milhar".
Wilson Batista morreria em 7 de julho de 68. Para atender seus dois últimos desejos, seria sepultado de smoking e ao anoitecer, cercado por uns poucos amigos que cantavam sambas antigos de sua autoria. Apesar de ter deixado mais de 700 músicas gravadas, morreu pobre. Um de seus parceiros, Alberto Ribeiro, a respeito do final de vida de Wilson, deu um triste depoimento: "Morreu, coitado, não tinha nem lençol da cama dele. Recebia Cr$ 700 de dois em dois meses, não dava nem para pagar o aluguel. Sofreu muitas ingratidões na vida. Às vezes era melhor vender as músicas, pois o direito autoral saía mais rápido. O bom bocado não é para quem faz, é para quem come".
Assim foi a vida desse gênio do samba, nascido a cem anos. Parabéns, rapaz folgado!

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