Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 8 de maio de 2015

Jimi Hendrix, o Mito Continua Vivo - Revista Manchete (1974) - 2ª Parte

"Mas Jimi - segundo o próprio Chandler - pretendia bem mais do que ser o guitarrista acompanhante de um conjunto inglês. Por isso, não muito tempo depois, tratou de se desgarrar. O que aconteceu, então, o próprio Jimi contou numa entrevista de 1969:
- 'Certa vez, estava tocando para um público frio, aparentemente desinteressado em mim, na minha música, no som que saía de minha guitarra. Foi então que explodi no palco, acordando toda aquela gente'.
A explosão de que Jimi falou, na entrevista, foi menos espontânea do que ele deu a entender. Na verdade, não foi a indiferença do público que o levou a tirar novos sons de sua guitarra, a compor os primeiros blues espaciais que o tornaram famoso, a utilizar ruídos inesperados em que seus espetáculos (canhões, metralhadoras, sinais eletrônicos, bombas), ou a tocar o seu instrumento de forma quase acrobática, numa coreografia selvagem, agressiva, que levava o público ao delírio. Tudo isso - que foi a sua marca - Jimi Hendrix estudou antes de fazer, consciente de que este era o modo de rebelar-se através da música.
Assim, depois de vitoriosas apresentações como solista em clubes londrinos, no Olympia de Paris e no Madison Square Garden de Nova York, organizou, com o baterista Mitch Mitchell e o contrabaixista Noel Redding, o trio The Jimi Hendrix Experience. A formação desse conjunto, o que representou na música popular moderna e alguns de seus momentos mais significativos estão documentados em Jimi Hendrix, filme de John Head e Gary Weis, atualmente em cartaz nos Estados Unidos. Depois de inúmeras e longas reportagens em jornais de todo o mundo, depois inclusive de uma completa biografia escrita por Alain Dister, o filme é mais uma tentativa de decifrar o espírito e a personalidade até certo ponto complexa de Jimi Hendrix.
The Jimi Hendrix Experience:  Redding,  Hendrix e Mitchell
- Não sei se conseguimos - diz Head. - Mas posso garantir que o filme reúne depoimentos valiosos de pessoas e músicos que conheceram Jimi Hendrix de perto. Além do mais, há o depoimento de sua própria música.
Intercalando números musicais das apresentações ao vivo em festivais pop (inclusive o de Woodstock) e gravações consideradas clássicas (as do álbum Are You Experienced?, por exemplo) com uma série de entrevistas valiosas, Head e Weis conseguiram, ao menos, dimensionar o mito Hendrix e documentar o fascínio que sua música exerce sobre o público jovem. Weis fala com entusiasmo do filme:
- Não tivesse ele outras qualidades, já bastaria a chance de revermos e ouvirmos outra vez Jimi, sua música espacial, seu protesto violento, sua voz agressiva, sua guitarra incrivelmente reinventada.
Hendrix talvez não tenha reinventado a guitarra, como quer Weis. Nem a terá canonizado, como afirmam alguns de seus admiradores mais ardorosos. Mas, é certo, foi o primeiro a tocá-la acrobaticamente - mordendo ou lambendo  as cordas, golpeando-as com fúria, arrebentando-as em pleno palco - sem ser confundido com um malabarista de espetáculo de variedades. Porque, acima de tudo, Jimi Hendrix foi um músico. Os que depuseram no filme de Head e Weis - gente de música como Pete Townshend, Eric Clapton, Mitch Mitchell - ou os que registraram suas impressões no álbum-homenagem editado pela Reprise - entre eles Mick Jagger, Little Richard, Buddy Miles - concordam plenamente com isso.
Jimi Hendrix foi, como um de seus amigos de infância afirma, um rebelde. Ele próprio, numa de suas explosões, se definiria:
- Afinal, este é o meu modo de ser. E minha música será sempre o símbolo da revolta negra.
Com Al Kooper, num show em Londres
 Embora nem sempre suas reações se fizessem através da guitarra - certa noite, enfrentou e venceu três racistas armados que o atacaram numa boate de Los Angeles - Jimi foi, em sua rebeldia, um homem pacato, muito diferente do que aparentava no palco. As drogas, o uso permanente delas para manter-se de pé e aceso em cima de um palco, o foram consumindo aos poucos. Ironicamente, morreu durante uma de suas poucas bebedeiras, na noite de 18 de setembro de 1970, asfixiado pelo próprio vômito, em Londres, cidade que escolhera para viver.
- Na América não há lugar para mim.
Pois foi na América, na mesma Seattle que o viu nascer, que Jimi Hendrix foi sepultado numa cerimônia simples e silenciosa, muito diferente de sua música. Dave Anderson, Danny Howell, Herbert Price Junior e três outros amigos de infância carregaram o caixão sobre o qual, durante o velório, haviam colocado a primeira guitarra do indecifrável Jimi."

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