Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Os 30 Anos de Stick Fingers (Rolling Stones) - Revista Shopping Music (2001)

Stick Fingers (1971) é um dos vários discos clássicos que os Rolling Stones produziram em sua fase áurea. Desde sua capa - um trabalho magistral de Andy Wharol - até seu conteúdo, é uma obra-prima do rock. Por ocasião de seus trinta anos, completados em 2001, a revista Shopping Music nº 5 (abr/2001) faz um balanço desse grande álbum. Segue abaixo a matéria:
"O começo dos anos 70 foi um momento de impasse para os Rolling Stones. A maior banda de rock do mundo, eles já eram. Mas havia um espectro sombrio sobre suas cabeças. Pouco antes, em 1969, não só o guitarrista Brian Jones, que havia sido demitido da banda, foi achado morto no fundo da piscina de sua mansão, como durante um esperado show no festival de Altamont, nos EUA, um espectador foi assassinado pelos Hell's Angels que deveriam cuidar da segurança. Simbolicamente, o sonho de paz-e-amor dos hippies acabou ali, naquele incidente. E no ano seguinte a banda encerraria a passagem pela gravadora Decca, com um disco ao vivo, Get Her Ya-Ya's Out.
Nesse meio tempo, o vocalista Mick Jagger cuidava de sua carreira cinematográfica (atuando em Ned Kelly e Performance) e o guitarrista Keith Richards consumia quantidades de droga capazes de matar qualquer ser humano comum. O que viria em seguida para os Rolling Stones era um mistério absoluto. Pois foi justamente nesse período estranho que a banda gravou um de seus melhores e mais célebres discos, Stick Fingers, o primeiro a ter integralmente em estúdio o guitarrista Mick Taylor (garoto recrutado entre os Bluebreackers, de John Mayall) e o primeiro lançado pelo próprio selo da banda.
No disco dos 'dedos grudentos' (cuja antológica capa de Andy Wharol tinha até um zíper de verdade nas primeiras edições em vinil), os ingleses renovavam sua fé naquilo que a música americana tinha de mais cru e autêntico: o rock, o blues e o country, sem concessões ao pop, o que ficaria muito mal para esses notórios bad boys que não nasceram negros no Mississipi por mera distração da cegonha. 
Stick Fingers por sinal, com um dos mais conhecidos rocks de todos os tempos: 'Brown Sugar', um dos maiores sucessos de rádio da banda, com suas alusões a droga (como em boa parte desse disco) e ao amor interracial. Ao longo dos anos 70, essa música foi a base para álbuns (e carreiras) inteiros de bandas do chamado hard rock.
Outra excelente faixa nessa linha é 'Bitch' - que, de certa forma lembra 'Live With Me', do disco Let It Bleed, de 69 - com vigorosos sopros sublinhando a linha de guitarra. E por falar no instrumento, Keith Richards (que passou boa parte das gravações do disco fora de si e desse mundo) manda um de seus riffs característicos na longa 'Can't You Hear Me Knocking', que se estende por uma paradinha de violão e bongô e cresce, num groove fantástico, quando entram baixo, sax e  o órgão de Billy Preston. Mick Taylor se encarrega de terminar o serviço com um solo emocionante.
Pleno de sentimento, Stick Fingers segue em alta com  a faixa 'Sway', em que Mick Jagger assume a sua melhor entonação soul e a banda promove um massacre, com arranjo de cordas e um outro grande solo de guitarra. 'I Got The Blues', vai, pungente, ainda no departamento soul, com oportuníssima intervenção do órgão de Preston. Na área das baladas, os Stones mostraram enfim terem chegado à maestria com 'Wild Horses', um grande momento de violão e poesia que se tornou o modelo para muitas baladas de hard rock dos anos 80 e 90.
Em clima dark - e não poderia ser menos - aparece outra maravilhosa balada do disco, 'Sister Morphine', uma das grandes canções dos Stones sobre drogas. A irmã morfina (a quem Jagger pede: 'transforme meus pesadelos em sonhos') e a doce prima cocaína embalam a dramática e triste faixa , que bem poderia ter sido cantada por Nick Cave.
Além dos clássicos, Stick Fingers tem uma miscelânea de faixas menos famosas, mas bem interessantes. A começar por 'Dead Flowers', um country-rock com letra raivosa-espirituosa: 'Você pode me  mandar flores de manhã/ Mandar flores mortas pelo correio/ Mandar flores mortas ao meu casamento/ Que eu não vou esquecer de botar rosas no seu túmulo'. 'You Gotta Move', por sua vez, é um blues castiço, com violão slide, gaita e um vocal de Jagger que não fariam feio diante de qualquer gravação das boas de um Muddy Waters.
O disco encerra com  alonga e doída 'Moolight Mile', em que o vocalista se contorce para extrair um falsete e o instrumental vai num empolgante crescendo, com  a ajuda de cordas. E esta é só mais uma prova de que, quando é pra fazer rock - rock mesmo! - não há ninguém melhor que os Rolling Stones, aqui num dos seus discos mais curtidos, que se quer sempre ouvir de novo, de novo, e de novo.

STICK FINGERS:
Data de lançamento: abril de 1971
Gravadora: Rolling Stones/Virgin
Nota: As longas gravações de Stick Fingers começaram em março de 1969 em Londres (no Olympic Souns Studios) e nos Estados Unidos (no Muscle Schools Studios, em Florence, Alabama) em dezembro. Foram retomadas em 1970, em março, na unidade móvel de gravação da banda, na Inglaterra, e nos Olympic Studios. Por lá mesmo, em fevereiro de 71, o disco foi finalizado. Sobre quem seria o modelo da foto de capa de Andy Wharol, Mick Jagger disse, maldoso, em 95: 'É um dos seus... protegidos. Essa é a palavra educada a se usar, creio.'
Repertório: 'Brown Sugar'/ 'Sway'/ 'Wild Horses'/ 'Can't You Hear Me Knocking'/ 'You Gotta Move'/ 'Bitch'/ 'I Got The Blues'/ 'Sister Morphine'/ 'Dead Flowers'/ 'Moonlight Mile' "

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